Mais detalhes emergem da conspiração de golpe militar mercenário na Venezuela

Dissemos desde o início que a oposição venezuelana e o governo dos EUA eram os responsáveis pela tentativa de golpe mercenário frustrado na Venezuela em 3 de maio. Com o passar dos dias, surgem mais detalhes que confirmam essa avaliação.


[Source]

No dia 6 de maio, a Venezuela anunciou a prisão de mais membros da força expedicionária mercenária que deveria realizar o golpe. Em entrevista coletiva com a presença da mídia internacional, o presidente Maduro deu mais detalhes sobre a tentativa de golpe. Durante a conferência de imprensa, Maduro mostrou um videoclipe com o mercenário e ex-soldado das Forças Especiais Luke Denman: um dos dois mercenários americanos presos como parte da força mercenária.

Um aspecto fundamental dessa saga é o contrato assinado por Guaidó e seus representantes com a agência de mercenários dos EUA Silvercorp USA, chefiada pelo ex-soldado das Forças Especiais Jordan Goudreau. O contrato era para a realização de um golpe militar, além de capturar Maduro e outras autoridades venezuelanas de alto escalão e entregá-las aos EUA.

O primeiro a mencionar o contrato foi Cliver Alcalá Cordones: um ex-oficial venezuelano que estava baseado na Colômbia quando emitiu uma declaração em vídeo citando-o. Alcalá fez parte da mesma tentativa de golpe militar a ser realizada por mercenários treinados em campos na Colômbia por mercenários norte-americanos. Quando a polícia colombiana apreendeu um esconderijo de armas, em 24 de março, destinadas a esses campos, a posição de Alcalá se tornou muito frágil. Para se proteger, ele divulgou um vídeo explicando o papel desempenhado na trama pelo líder da oposição venezuelana Juan Guaidó. Ele então se entregou às autoridades e foi levado pela Drug Enforcement Administration (DEA)1 para os EUA, onde foi indiciado por acusações de narcotráfico. Ele provavelmente fechou um acordo em que testemunhará contra o presidente Maduro e outras autoridades venezuelanas.

Em sua declaração em vídeo, Luke Denman confirmou a existência dos campos de treinamento na Colômbia e deu sua localização precisa em Rioacha, na costa do Caribe, a menos de 100 km da fronteira venezuelana em Zulia.

Oposição e Washington implicados

A existência do contrato também foi confirmada por Jordan Goudreau, chefe da Silvercorp USA, na segunda-feira, quando a operação já estava em dificuldades. Ele mostrou várias páginas do documento principal, que tinha as assinaturas da Silvercorp USA, do lobista reacionário venezuelano JJ. Rendón, do legislador venezuelano Sergio Vergara e de Juan Guaidó, bem como de Miguel J. Retureta, advogado cubano-americano reacionário especializado na defesa de narcotraficantes (incluindo o filho do ex-ditador hondurenho Lobo e o irmão do presidente ilegítimo de Honduras, Juan Orlando Hernandez).

Depois de certo tempo, Juan Guaidó e seus porta-vozes declararam que o contrato era falso e que ele nunca o havia assinado. No entanto, agora JJ. Rendón admitiu em uma entrevista na CNN que o contrato existe e que ele o assinou. Embora ele diga que Juan Guaidó nunca assinou o contrato, o fato é que Rendón e Vergara o fizeram e estavam agindo em nome de Guaidó, que havia nomeado Rendón como chefe de um “Comitê de Planejamento Estratégico” para lidar com, precisamente, a organização de conspirações para remover Maduro do poder. Rendón repetiu sua versão do Washington Post, acrescentando que pagou a Goudreau US$ 50 mil pelas despesas, do próprio bolso.

Embora Rendón tente minimizar o significado do contrato, que ele descreve como um “teste” do que era possível, o contrato em si é muito específico e fala sobre “Uma operação para capturar/deter/remover Nicolás Maduro … remover o atual regime e instalar o reconhecido presidente venezuelano Juan Guaidó”.

Rendón afirma que, depois de assinar o contrato, ficaram ansiosos e começaram a duvidar da capacidade de Goudreau de executar o plano; então, eles romperam o acordo em uma reunião em seu apartamento em Miami, em 11 de novembro. Mesmo que você acredite nessa versão da história, permanece o fato de que a oposição venezuelana assinou um contrato com uma agência de mercenários para realizar um golpe, e que, se romperam o contrato, isso ocorreu apenas porque não tinham convicção de que esse grupo de mercenários seria capaz de realizá-lo!

Não há dúvida de que Guaidó estava plenamente ciente do contrato e, de fato, Goudreau forneceu uma gravação em áudio de uma conversa com Guaidó, a qual o Washington Post aceita como verídica.

A história do Washington Post também confirma que Goudreau esteve em contato com Schiller, um guarda-costas de Trump de longa data, algo que já era conhecido. Além disso, Goudreau se gabou de ter trabalhado na segurança de Trump em vários comícios.

Goudreau e sua agência mercenária Silvercorp foram responsáveis pela segurança no chamado concerto de “ajuda humanitária” em Cúcuta, Colômbia, em fevereiro de 2019, organizado e assistido por Guaidó. Foi aí que Goudreau fez contato com vários desertores do exército venezuelano que foram encorajados por Guaidó a atravessar a fronteira. É possível que ele tenha conseguido o emprego no show como resultado de seus vínculos com Schiller e sua agência de segurança.

Um relatório separado da AP [Associated Press] fornece outros detalhes significativos. Primeiro, vincula o esconderijo de armas apreendido pela polícia colombiana em março a Goudreau: “O estoque, no valor de US$ 150.000, incluía lunetas, óculos de visão noturna, rádios bidirecionais e 26 rifles de assalto fabricados nos Estados Unidos, com os números de série apagados”. Parte do equipamento foi vendido pela High-End Defense Solutions, com sede em Miami. Segundo a AP, essa é “a mesma empresa que Goudreau visitou em novembro e dezembro, supostamente para obter armas, segundo dois ex-soldados venezuelanos que afirmam ter ajudado os estadunidenses a escolher o equipamento”.

Em segundo lugar, a AP cita “dois ex-policiais” que alegam que “um informante se aproximou da Administração de Repressão às Drogas na Colômbia antes da apreensão das armas com um palpite infundado sobre o suposto envolvimento de Goudreau no contrabando de armas“.

Então, aqui está, preto no branco: a DEA sabia, pelo menos em março ou talvez antes, que Goudreau estava contrabandeando armas para a Colômbia. O que eles fizeram sobre isso? Segundo os ex-agentes citados pela AP: “A agência antidrogas, sem saber quem era Goudreau na época, não abriu uma investigação formal“. Achamos isso difícil de acreditar. De fato, o mesmo relatório da AP acrescenta algumas frases depois: “Um dos funcionários disse que as informações foram posteriormente repassadas ao Departamento de Segurança Interna“. Essa é a confirmação de que o governo dos EUA sabia que Goudreau estava contrabandeando armas para a Colômbia. É muito difícil acreditar que eles não se aprofundaram nisso.

Há outro aspecto de toda a história, que não foi totalmente discutido. Alcalá Cordones entregou-se à polícia colombiana e à DEA no final de março. Eles não perguntaram sobre os campos de treinamento de mercenários venezuelanos sobre os quais ele falou em uma fita de vídeo? Eles não investigaram isso mais profundamente? Novamente, isso é muito difícil de acreditar. As autoridades estadunidenses e colombianas devem ter sabido o que estava acontecendo sob seus próprios narizes. Eles são reacionários, às vezes desajeitados, mas não são completamente estúpidos.

Terceiro, a história da AP acrescenta mais detalhes à trama. De acordo com fontes da AP: “A Silvercorp comprou em dezembro um barco de fibra de vidro de 41 pés, segundo mostram os registros de embarcações da Flórida; e, em fevereiro, obteve uma licença para instalar equipamentos de navegação marítima. Em sua solicitação à Comissão Federal de Comunicações, ele disse que o barco viajaria para portos estrangeiros”.

As mesmas fontes mencionam que o barco da agência de mercenários foi visto na Jamaica, “onde Goudreau se reuniu com alguns de seus amigos das forças especiais que tentavam participar da operação“, mas que, “enquanto estavam preparando a operação, o barco quebrou em alto mar em 28 de março, e um sinal de rádio indicador de posição de emergência foi ativado, alertando as autoridades navais na ilha de Curaçao. Goudreau teve que voltar para a Flórida, impedido de voltar a reunir suas tropas antes do desembarque por causa das restrições de viagem impostas devido à pandemia de coronavírus”.

Essa história sobre a Jamaica mostra a natureza pouco profissional dessa gangue mercenária, que parece ter-se inspirado na série Jack Ryan da Amazon Prime. Mas também confirma um relatório separado sobre a Jamaica publicado pelo site ConnectingVets.com nos EUA: “Uma fonte militar dos EUA que também conversou com o Connecting Vets, sob a condição de anonimato, disse que a CIA se havia inteirado, na Jamaica, do golpe de estado e alertou Silvercorp para não continuá-lo em inúmeras ocasiões”. Independentemente da alegação de que a CIA tentou impedi-los de avançar, o ponto mais importante é que isso indicaria que a CIA sabia de tudo sobre o enredo. Talvez vendo como estavam mal organizados, tentaram convencê-los a não seguir em frente. Seja qual for o caso, a CIA sabia e não fez nada para realmente impedi-los, além de, talvez, tentar dissuadi-los disso com algumas cervejas.

Guaidó sabia

Todas as alternativas acima são evidências conclusivas de que Guaidó estava totalmente ciente e fazia parte dessa trama, mesmo que tenha se retirado no último minuto. A oposição venezuelana está repleta de facções e de lutas pelo poder entre diferentes grupos. É bem possível que isso tenha contribuído para o desenrolar dessa operação, que foi infiltrada pelo governo venezuelano. O ministro da Comunicação da Venezuela, Jorge Rodriguez, afirmou que houve uma disputa de poder dentro do plano de golpe mercenário entre Alcalá Cordones e Ivan Simonovis (um ex-policial que foi preso por sua participação no golpe de abril de 2002 contra Chávez e libertado da prisão pelo fracassado golpe de Guaidó em 30 de abril de 2019).

O governo dos EUA insistiu, em declarações de Trump e Mike Pompeo, que não estava envolvido no golpe. Claro, essa é a velha história. Quando você se envolve em uma aventura militar estrangeira, sempre precisa da possibilidade de negar o fato. Se a trama der certo, você revela publicamente o seu papel e reivindica o crédito. Se falhar, você nega ter tido qualquer conhecimento.

No entanto, se você ouvir atentamente a negativa de Pompeo, poderá se aproximar da verdade. O que ele realmente disse foi que os EUA “não tiveram envolvimento direto”, o que obviamente significa que eles sabiam e estavam envolvidos indiretamente. Ele se orgulha de que, se Washington estivesse envolvido “as coisas teriam saído de maneira diferente“, e, então, quando lhe perguntaram sobre o que sabia do financiamento da operação, ele sugere que sabia e que as informações serão reveladas oportunamente. É uma clara admissão de que o governo dos EUA tinha conhecimento prévio dessa trama e não fez nada para impedi-la nem alertar o governo venezuelano sobre isso.

Escandalosamente, Pompeo diz que o governo dos EUA usará todas as ferramentas disponíveis para recuperar os dois mercenários norte-americanos presos, mas não oferece uma palavra de condenação à tentativa. Estamos falando aqui de um grupo de mercenários tentando um golpe de Estado em um país soberano, de um grupo treinado e organizado por uma agência de mercenários dos EUA, mas Pompeo não acha necessário dizer que seu governo “rejeita tais métodos” ou qualquer outra coisa nesse sentido. De fato, o governo dos EUA não rejeita tais métodos, ele os utilizou muitas vezes no passado e é bastante claro ao dizer que, de fato, o que lamenta é que a trama tenha falhado: “se estivéssemos envolvidos, teria sido diferente”.

Obviamente, quando o Departamento de Justiça dos EUA oferece uma recompensa de US$ 15 milhões por “informações que levem à captura de Nicolás Maduro”, você espera que alguém tente reivindicar o resgate. Esse é o objetivo de se oferecer uma recompensa.

Também vale a pena notar que nenhum dos 50 governos ao redor do mundo, que reconheceram Guaidó como “presidente”, proferiu uma palavra de condenação por essa conspiração, nem pela participação de Guaidó nela. Tudo isso pela “restauração da democracia” de que tanto falaram.

O Washington Post também publicou os anexos do contrato: um documento muito esclarecedor de 41 páginas, que o Post diz que “foi fornecido por funcionários da oposição venezuelana“. Isso confirma a veracidade do documento e o envolvimento oficial da oposição venezuelana na trama.

O documento é extremamente detalhado e aborda todos os diferentes aspectos do golpe mercenário planejado.

O contrato inclui todos os tipos de detalhes sobre programações de pagamento, recuperação de ativos, metas que devem ser cumpridas, danos colaterais, técnicas de controle de multidões (incluindo o uso de força letal), danos à infraestrutura etc. Há uma seção sobre seguros para os “membros da força-tarefa“, caso sejam mortos ou mutilados na execução de suas atividades assassinas. Existe até uma seção sobre “direitos de propriedade“, como se houvesse algo único nesse golpe militar! Estranhamente, o contrato inclui uma cláusula de igualdade de direitos.

É sempre elogiável que mercenários executantes de um golpe militar tenham tanta preocupação com a inclusão! Que comovente … Tenho certeza de que os trabalhadores e camponeses venezuelanos realmente gostariam de ser mortos a tiros por uma “equipe de projeto diversificada e inclusiva“. A única coisa que parece estar faltando é a provisão de direitos trabalhistas e sindicais para os mercenários!

No final do contrato, no entanto, há um pouco do que foi redigido por instruções dos funcionários da oposição venezuelana que entregaram o documento ao Washington Post.

Isso é muito significativo. A parte editada está na seção que trata da cadeia de comando. Essa seção inclui o “Presidente Juan Guaidó” como “Comandante em Chefe” (ele gosta de se proclamar supremo em vários cargos…), portanto, a redação não pode ser para protegê-lo. A única explicação lógica é que a parte redigida faz menção ao papel desempenhado pelos EUA, por meio de algum agente ou outro designado para esse cargo.

Mais uma vez, vale ressaltar que os anexos ao acordo são assinados por Sergio Vergara como “Alto Comissário Presidencial para Gerenciamento de Crises” em nome da “República Bolivariana da Venezuela” de Guaidó.

Como Guaidó ainda pode afirmar não saber nada sobre o documento, está além do que podemos acreditar.

Os golpistas vagam livremente

Nos próximos dias e semanas, a história completa por trás desse ataque mercenário será revelada e temos certeza de que revelará a responsabilidade de Guaidó e de seu mestre de marionetes, Trump.

Alguns, na Venezuela e no exterior, incluindo o presidente Maduro, compararam esse ataque mercenário ao desembarque de contrarrevolucionários em Cuba na Baía dos Porcos (Playa Girón), apoiado pela CIA, em 1961. Tudo o que precisa ser dito sobre isso é que Playa Girón marcou um ponto de virada na radicalização da Revolução Cubana: o armamento geral de trabalhadores e camponeses para combater a contrarrevolução, a declaração do caráter socialista da revolução e o início da expropriação dos capitalistas, latifundiários e propriedades imperialistas, o que levaria dentro de alguns meses à abolição do capitalismo na ilha.

Infelizmente, o caminho seguido pelo presidente da Venezuela, Maduro, é o oposto: a prisão de ativistas revolucionários e combatentes da revolução agrária, o retorno de terras aos proprietários de terras, a privatização de empresas nacionalizadas e ofertas de diálogo, concessões e unidade nacional à conspiração reacionária da oposição e dos capitalistas. E Guaidó permanece livre para continuar a conspirar.


Notas:

1 Órgão de polícia federal do Departamento de Justiça dos Estados Unidos encarregado da repressão e controle de narcóticos. O órgão foi criado em 1973.

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