Irã: o assassinato de Qassem Soleimani – oponha-se à agressão imperialista dos EUA

No início da manhã de sexta-feira (3/1), em um ato de suprema arrogância, a administração Trump realizou o assassinato do General iraniano Qassem Soleimani, bem como do principal líder paramilitar iraquiano, Abu Mahdi al-Mohandes, no aeroporto de Bagdá. Mais uma vez, o imperialismo EUA está adicionando instabilidade no Oriente Médio.

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Trump tentou pintar o ataque, que também matou outros oito iranianos e iraquianos, como uma medida defensiva. Mas nada mais é do que a execução sumária de líderes de dois Estados soberanos em solo estrangeiro, realizada sem sequer buscar aprovação do Congresso. Segundo Donald Trump, Soleimani estava planejando um ataque iminente, que poderia custar a vida de centenas de norte-americanos. A única evidência para apoiar isso é que Soleimani havia visitado grupos de milícias apoiadas pelo Irã no Líbano, na Síria e no Iraque, na sequência de uma visita ao Aiatolá Khamenei no Irã. Como isso pode ser traduzido como um ataque iminente aos EUA é uma incógnita.

Além disso, Soleimani era o principal comandante da Guarda Revolucionária do Irã no exterior. Ele não fazia parte de um grupo operativo em ação e, portanto, matá-lo não iria deter os planos de quaisquer ataques iminentes. Aqueles que estão agora tentando, ex post-facto, justificar esse ato de agressão imperialista são os mesmos que nos contaram mentiras descaradas sobre as supostas “armas de destruição em massa” de Saddam Hussein e fabricaram a suposta “ameaça iminente”, a fim de justificar o lançamento da devastadora ocupação do Iraque.

Trump, e quase todos os Republicanos e Democratas no Congresso, também sustentam que o ataque foi justificado uma vez que Soleimani estava por trás do “assassinato de mais de 600 estadunidenses”. Mas não mencionam que Soleimani estava apoiando as milícias xiitas que lutavam contra forças de ocupação dos EUA. Essa ocupação, até agora, levou a pelo menos 1,5 milhões de vidas iraquianas perdidas! Além disso, essas mesmas milícias estavam alinhadas com os EUA na guerra contra o Estado Islâmico. De fato, algumas delas ainda estão posicionadas junto a tropas norte-americanas.

Ataque imperialista sem máscaras

Trump afirma que Soleimani também desempenhou um papel-chave na supressão de movimentos de protesto no Iraque, Irã e Líbano. Isso pode ser certo, mas, como podemos ver a partir das cálidas relações de Trump com a monarquia saudita e o regime israelense, os direitos democráticos dos manifestantes – ou de qualquer outra pessoa – nunca foram prioridade para ele. De fato, os manifestantes iraquianos na Praça Tahrir condenaram de forma correta o ataque dos EUA.

Esse não passou de uma ataque imperialista descarado com o objetivo de submeter duas nações soberanas. É dever de todos os lutadores de classe, sindicalistas e revolucionários opor-se resolutamente a esse ataque e a quaisquer outras agressões imperialistas no Oriente Médio. Devemos expor os interesses reais por trás desse ato, que não têm nada a ver com a difícil situação dos pobres e oprimidos no Oriente Médio, nem com a proteção dos trabalhadores e pobres do Ocidente, e sim tudo a ver com os estreitos interesses da classe capitalista.

O único fator decisivo por trás da decisão de Trump foi, como sempre, o puro interesse próprio. Em particular, Trump está interessado em desviar a atenção de seu próprio impeachment, bem como em se posicionar como um homem de ação aos olhos de seus amigos e inimigos. Tentando compensar a humilhação de sua inação depois que o Irã derrubou um drone norte-americano em junho do ano passado e do ataque às instalações de petróleo sauditas em setembro, Trump decidiu dar um exemplo.

Foi incitado por uma camada de Republicanos e outros elementos dentro do aparato de segurança, que estão decididos a provocar um conflito com o Irã a fim de restaurar o prestígio das forças armadas dos EUA depois de anos de reveses humilhantes. Mas essa miopia extrema, uma característica fundamental da classe dominante hoje, corre o risco agora de jogar ainda mais combustível em uma região que já é muito instável. E seu resultado não será no interesse de Trump ou do imperialismo norte-americano.

Já estão aumentando as pressões sobre os EUA para sua retirada do Iraque. As forças especiais dos EUA estão se retirando de posições avançadas para defender as bases norte-americanas. O parlamento iraquiano está adotando medidas para dar um fim ao acordo militar entre os dois países, a fim de forçar a saída dos EUA do Iraque. Este pode ser um sério golpe para o imperialismo estadunidense.

Mas como um jogador numa sequência de derrotas, Trump está dobrando sua aposta. Ameaçou bombardear 52 alvos no Irã, alguns dos quais seriam importantes sítios culturais. Ao plano do parlamento iraquiano de expulsar as forças norte-americanas do Iraque, ele respondeu ameaçando impor sanções e coisas piores ao Iraque. A classe dominante dos EUA alegou que a invasão do Iraque foi uma medida para introduzir a democracia e a paz, e, no entanto, está lançando abertamente sérias ameaças contra as decisões do parlamento iraquiano. O que estamos vendo é a verdadeira face do imperialismo.

É verdade que alguns Democratas, liderados por Nancy Pelosi, se opuseram à ação de Trump. Mas sua objeção não é à política imperialista dos EUA no Iraque, e sim como essa política é realizada! O Partido Democrata, tantas vezes apresentado como a mão terna do capitalismo estadunidense, supervisionou o aumento massivo dos bombardeios e campanhas externas durante a presidência de Obama. Não são menos imperialistas do que Trump. Sua queixa é que as ações de Trump não são benéficas ao imperialismo norte-americano.

Brincando nas mãos de Teerã

Nisso, eles podem ter razão. Embora Soleimani fosse uma figura fundamental para o regime iraniano, seu assassinato fez o seu jogo. Nos últimos meses, o Irã e seus aliados no Líbano e no Iraque foram inundados por poderosos movimentos de massa com implicações revolucionárias. No Iraque, em particular, o que é conhecido como a Revolução de Outubro tem como objetivo combater a pobreza, o desemprego, a corrupção e também a influência iraniana quase onipresente no aparato do Estado.

No Líbano, o governo liderado pelo Hezbollah também esteve sob imensa pressão do movimento revolucionário que começou em setembro. Mas nem no Líbano nem no Iraque o regime conseguiu estabilizar a situação. De fato, Soleimani viajava freneticamente entre Beirute, Bagdá e Teerã a fim de coordenar o esforço contrarrevolucionário com os aliados e os representantes iranianos.

No próprio Irã, irromperam dois dias de protestos violentos depois do corte abrupto dos subsídios aos combustíveis em novembro. Muito rapidamente, esses protestos foram além das demandas econômicas para exigir a derrubada do regime. O regime só foi salvo pelo blecaute completo da mídia e pela repressão que matou pelo menos 1.500 pessoas, feriu outras milhares mais e prendeu mais de 10 mil. Esse foi um dos mais poderosos desafios à República Islâmica em seus 40 anos de história e deixou o regime severamente enfraquecido.

Naquele momento o regime fracassou em mobilizar uma contra-demonstração, conseguindo reunir apenas algumas dezenas de milhares. Mas o funeral de Soleimani reuniu milhões de pessoas por todo o Irã nos últimos dias. Cenas semelhantes também foram vistas no Iraque, onde se relata que 500 mil pessoas participaram das cerimônias do funeral. Os ataques e ameaças de escalada de Trump fortaleceram o regime iraniano e enfraquecerão os movimentos revolucionários no próximo período.

Os iranianos estão agora indo à ofensiva. No Iraque, onde os EUA e o Irã lutam pelo aparato de Estado iraquiano há alguns anos, os iranianos estão agora pressionando pela expulsão total dos EUA, removendo suas tropas, conselheiros e aliados no aparato estatal. Também estão pressionando os norte-americanos no Afeganistão, enquanto se retiram completamente do tratado nuclear, o que significa que provavelmente começarão a desenvolver armas nucleares.

E os EUA pouco podem fazer a respeito. Houve muita conversa sobre guerra nos últimos dias, mas a probabilidade de a situação atual levar a uma invasão dos EUA está descartada. A população dos EUA está cansada de guerras, razão pela qual uma das promessas fundamentais da campanha de Trump em 2016 foi se retirar do Oriente Médio. Além disso, a dívida nacional dos EUA é de mais de US$ 23 trilhões. Uma nova guerra, que custaria entre 5 e 10 trilhões de dólares a mais, está fora de questão. Uma nova grande guerra dos EUA teria repercussões sociais e políticas sem precedentes.

Passados 17 anos da invasão do Iraque, os EUA perderam as guerras no Iraque e no Afeganistão. O Irã seria um inimigo ainda mais formidável. O Irã tem um terreno montanhoso, um exército forte e endurecido na batalha e uma população que é profundamente anti-imperialista. Também possui mísseis de longa distância e grupos de aliados em toda a região, que podem atingir, de qualquer lado, dezenas de milhares de soldados dos EUA ali estacionados. Também pode fechar o Estreito de Ormuz, que é a passagem do petróleo para o mercado mundial. Essa seria uma enorme ameaça para a frágil economia mundial.

Por todas essas razões, uma invasão do Irã está fora de questão. Mesmo uma campanha aérea séria dos EUA não é viável, pois colocaria quase todas as bases dos EUA no Oriente Médio sob riscos de ataque. As ações dos EUA confirmam isso. Embora tenham sido enviadas tropas adicionais à região para sustentar a defesa dos interesses existentes dos EUA, estão longe do que seria necessário para uma campanha militar séria. Naturalmente, as ações erráticas de Trump podem se transformar em algum tipo de confronto militar, mas seria muito arriscado para o imperialismo estadunidense, que é improvável que se dê bem com isso.

Contra o imperialismo!

Os eventos dos últimos dias foram acima de tudo um sinal da fraqueza do imperialismo dos EUA e não da sua força. Não existe um poder tão forte quanto o imperialismo dos EUA e, no entanto, em termos relativos, esse imperialismo não é mais tão forte quanto costumava ser. À medida em que os acontecimentos se desenrolem, isso se tornará mais claro. Como um terremoto que revela as contradições que se acumulam sob a superfície, o comportamento errático de Trump trará à tona o novo equilíbrio de forças que se desenvolveu no Oriente Médio. Nessa nova situação, o imperialismo EUA será forçado a desempenhar um papel menor. Mas isso não significa mais estabilidade ou melhores condições para as massas da região.

Nossa tarefa é nos opormos ao imperialismo. Somente pela derrubada do capitalismo podemos assegurar a paz e a estabilidade, pondo fim a um regime apodrecido que significa guerra, miséria e exploração para as massas.