Honduras: as massas conquistam uma vitória eleitoral histórica

Este texto foi originalmente publicado no dia 29 de novembro. Segundo os dados mais recentes, com cerca de 62% dos votos apurados, Xiomara Castro segue em primeiro lugar, com 51,73% dos votos. Em declaração pública, os dirigentes do Partido Nacional, que atualmente governa o país, reconheceram a derrota para a candidata da oposição.

Da Redação

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Xiomara Castro, candidata do Partido Libre (Partido da Liberdade e da Refundação), principal força da coalizão de oposição, venceu as eleições em Honduras. O regime estabelecido pelo golpe de 2009 foi derrubado. Com 40% dos votos apurados, Xiomara está à frente com 53,61% contra 33,87% de Nasry Afura (apelidado de “Papi a la orden” – “Paizinho da lei e da ordem”) do Partido Nacional, o candidato que representa a continuidade do golpe.

Há uma atmosfera de tremenda alegria entre as pessoas que agora estão pensando: “Eles estão indo embora!”. O resultado das eleições traz consigo uma enorme esperança de mudança. Depois que os Partidos Liberal e Nacional se uniram para derrubar o ex-presidente Mel Zelaya por meio de um golpe desajeitadamente executado em 2009, o primeiro está agora em processo de dissolução e obterá cerca de 9% dos votos. Na verdade, uma seção do Partido Liberal votou abertamente em Xiomara.

O Partido Nacional acabou governando na esteira do golpe, fazendo-o por meio de processos eleitorais ridículos e flagrantemente fraudulentos. Hoje, eles estão completamente desacreditados. Foi apenas a força bruta que manteve uma oligarquia cada vez mais degenerada no poder. Além de totalmente corruptos, os escalões superiores do Estado naqueles anos fortaleceram seus laços com o crime organizado, criando efetivamente um narco-Estado. Novamente, a fraude eleitoral estava em ação, mas desta vez foi bloqueada pela mobilização ativa e genuinamente em massa do povo. A campanha de medo continuou, assim como a campanha de desinformação na grande mídia e nas redes sociais. A abstenção do eleitor foi encorajada. A mídia afirmava que Xiomara ia matar crianças porque era pró-aborto, quando o que ela propôs mesmo foi a descriminalização e legalização das pílulas anticoncepcionais.

A mídia alertou que, com Xiomara, vem o comunismo, que – segundo o clássico discurso patriótico da extrema direita na América Central – significa caos, morte e autoritarismo. Se já em 2017 os métodos da direita hondurenha eram ineficazes, agora eram menos que obsoletos. Em 2017, eles conseguiram impor resultados eleitorais fraudulentos por meio da repressão estatal, graças à hesitação dos líderes de esquerda. Se tivessem tentado de novo hoje, teriam provocado uma resposta revolucionária das massas, e a oligarquia teria corrido o risco de perder tudo.

O fator decisivo: a ação das massas

A aliança da oposição promoveu a importância do voto desde o início de sua campanha e, de fato, houve um grande comparecimento a partir dos primeiros minutos e horas da votação. A votação terminou às 17h, mas nos locais onde havia fila de espera o horário de votação teve que ser estendido até que os últimos terminassem de votar. As filas depois das 17h eram enormes. Houve tentativas de fechar os locais de votação mais cedo, mas atos de pressão popular impediram isso.

Sob a pressão da oposição aos golpistas, na esteira da fraude de 2017 foram estabelecidos um conselho eleitoral e mecanismos para tornar a votação mais transparente – a carteira de identidade nacional foi removida e métodos de verificação eletrônica foram aplicados durante a eleição. Em Honduras, até os mortos votam, e os vivos costumam votar mais de uma vez! Essas novas medidas reduziram o alcance dos trapaceiros.

O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) tem trabalhado em condições de boicote permanente e continua a sofrer muitos problemas em seu funcionamento. As eleições não foram perfeitas de forma alguma, e os membros e apoiadores do Partido Nacional não cessaram seus métodos desleais. Os pacotes de cédulas eleitorais foram entregues já abertos e o equipamento de votação (cabos, tinta etc.) chegou incompleto. Isso fazia parte de um claro boicote à CNE e deveria resultar em fraude. Não se tratava de uma celebração da “democracia”. Em vez disso, a participação massiva das massas nas eleições e o descrédito do regime e do Partido Nacional desorganizaram qualquer possibilidade de fraude.

Os mecanismos que foram utilizados ​​no passado para controlar as massas fracassaram em manter um regime que sobreviveu a si mesmo. As massas entendem que cabe a elas participar da política e que é necessária uma mudança profunda na sociedade. Já que os líderes do Libre não deram uma perspectiva de luta revolucionária desde a fraude eleitoral de 2017, as novas eleições se tornaram um ponto focal para as massas – uma oportunidade que elas não perderam. Na verdade, as massas não deixaram de intervir em todas as oportunidades históricas que se apresentaram. Eles não falharam em 2009, quando se mobilizaram de forma revolucionária contra o golpe. Eles não falharam em 2017, quando se mobilizaram de forma revolucionária contra a fraude eleitoral. Aqueles que hesitaram e não conseguiram chegar ao fim foram os líderes de esquerda. Se o tivessem feito, a ditadura já teria caído há muito tempo.

O Partido Nacional: destinado à lata de lixo da história

O cinismo dos membros e apoiadores do Partido Nacional não tem limites. David Chávez, o candidato do Partido Nacional pelo distrito central, declarou às 8h22 – quando a votação estava iniciando – que ele e seu partido já haviam ganhado as eleições. Quando ele foi votar, as pessoas gritaram insultos contra ele, o chamaram de viciado em drogas e narco-traficante, até que suas vozes se uniram em gritos de “Cai fora JOH!”, referindo-se a Juan Orlando Hernández (JOH), o atual presidente. Para a oligarquia, as eleições são um estorvo necessário durante o qual convocam as massas a votarem para decidir quem as governará. Mas hoje eles foram desarmados diante da ação das massas trabalhadoras, que tomaram a história em suas próprias mãos.

Foram as massas que defenderam o voto. O povo se reuniu em torno da contagem dos votos para garantir que as eleições não fossem roubadas mais uma vez.

Os membros e apoiadores do Partido Nacional, que haviam se declarado vencedores duas vezes durante o dia, finalmente calaram-se. No seu primeiro comunicado da noite, a CNE indicou a tendência clara: Xiomara estava a ganhar. As massas foram às ruas para comemorar e o bunker eleitoral do Partido Nacional ficou vazio.

A retumbante vitória eleitoral de Xiomara Castro e de Libre é claramente irreversível, embora ainda não tenha sido declarada oficialmente enquanto a contagem continua. Essas eleições são um momento decisivo na história de Honduras. É a primeira vez que um partido de esquerda vence uma eleição nacional. O antigo regime bipartidário de nacionais e liberais (a versão hondurenha dos republicanos e democratas) recebeu seu golpe mortal. Seus aparatos se recusaram a morrer, mas esse regime foi jogado na lata de lixo da história. No entanto, a crise orgânica do capitalismo em Honduras requer mais do que o colapso de um regime. Requer uma mudança radical do sistema.

Hoje há uma alegria enorme em Honduras. Quem pode negar ao povo hondurenho, enquanto tomam as ruas para festejar, a alegria de ter derrotado os golpistas? Pessoas vestidas de vermelho gritam “¡Hasta la victoria siempre!” [“Até a vitória, sempre!”, frase de Che Guevara que ficou famosa]. O povo comum – os verdadeiros protagonistas dessa vitória – disse à UNE TV: “Meu país voltou a ter coração”. “Libertamos o país desse narcotráfico, somos livres. Eles estão partindo, eles partiram!”

Os trabalhadores votam pela mudança

Xiomara deve vencer em 17 dos 18 departamentos – em El Paraíso, Nasry Asfura [candidato presidencial do Partido Nacional] tem um pouco mais de 2% dos votos. Xiomara agora se tornará a primeira mulher presidente na história do país. Na capital, o Libre venceu. No distrito central, Xiomara obteve 52,19% dos votos contra 38,26% de Nasry Asfura.

Em Cortés, Xiomara obteve mais de 63% dos votos e Nasry 21,44%. Neste departamento está localizada a importante cidade industrial de San Pedro Sula (que será governada por Libre) e Choloma, o município onde vive o maior número de trabalhadores. Aqui, uma vitória ainda maior foi alcançada – Nasry Asfura levou pouco mais de 15% dos votos em comparação com 75% para Xiomara Castro. O voto dos trabalhadores inclinou-se claramente a favor de Libre.

Sem concessões à oligarquia e ao imperialismo!

A direita hondurenha e centro-americana fez campanha pelo voto contra Xiomara Castro dizendo que com ela vem o comunismo. É significativo que esta campanha tenha fracassado em desencorajar as massas de votar. Isso reflete o fato de que as pessoas aspiram por uma mudança radical. Isso agora deve ser realizado.

Xiomara realizou um comício à noite em que disse: “Vamos formar um governo de reconciliação em nosso país. Um governo de paz e um governo de justiça. Vamos iniciar um processo em Honduras para garantir a democracia participativa e a democracia direta”. Ela também acrescentou: “Vou convocar um diálogo com todos os setores da sociedade hondurenha, a partir de amanhã, para que possamos usar os pontos comuns de acordo e, para isso, formar a base mínima para o próximo governo”.

E disse que vai dialogar não só com organizações sociais, mas também com empresários e organismos internacionais.

Em tweet, Xiomara agradeceu à Câmara de Comércio Empresarial: “Obrigado CCIT (Câmara de Indústria e Comércio de Tegucigalpa), vamos trabalhar em conjunto com o setor privado para melhorar o clima de investimento a fim de criar empregos”. Ao que o CCIT respondeu parabenizando Xiomara dizendo que trabalhariam de mãos dadas “a favor da livre empresa e do povo hondurenho”.

O povo hondurenho votou por uma mudança radical e, como tal, nenhuma concessão deve ser feita à oligarquia, aos empresários e aos imperialistas. Xiomara deve ser consistente e cumprir seu programa: dar direitos às mulheres, melhorar a qualidade de vida dos hondurenhos e nacionalizar as empresas e serviços que foram privatizados.

Foi o povo que conquistou esta vitória. São os trabalhadores organizados, os camponeses, os desempregados, os estudantes e as mulheres que lutam contra a opressão, em uma base de classe, que devem cumprir a tarefa de reconstruir Honduras, fazendo dela um país onde haja justiça para os explorados.

Honduras é um país pobre que sofre o assédio permanente do imperialismo. Quando tentou defender sua soberania, os oligarcas deram um golpe, apoiados pelo imperialismo. Os últimos 12 anos foram um período sombrio. Naquele período, porém, o povo hondurenho adquiriu ricas experiências e lições por meio da luta revolucionária. Hoje, com a abertura da democracia, haverá muitas ilusões. Mas isso também pode trazer encorajamento, fazendo avançar as organizações de massas de trabalhadores, mulheres e jovens.

Um fator significativo nesta eleição foi a presença de muitos jovens: aqueles que eram crianças quando ocorreu o golpe. Esta é uma geração nova e dinâmica que deseja uma sociedade diferente. A única maneira de conseguir isso é confiar na organização revolucionária das massas e atacar os privilégios da oligarquia e dos imperialistas em benefício do povo. Xiomara ficará sob a pressão de classes com interesses conflitantes. A organização da classe trabalhadora é necessária, defendendo um programa baseado na clara defesa dos nossos interesses de classe. É necessário construir uma tendência claramente socialista e internacionalista dentro do Libre, dos sindicatos, do movimento juvenil e do movimento feminino. Nós convidamos você a construí-lo – junte-se à Izquierda Marxista.

TRADUÇÃO DE FABIANO LEITE.

PUBLICADO EM MARXIST.COM

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