Coreia do Sul: um ano de regime de Yoon Suk-yeol, o conflito de classes se intensifica

O dia 1º de maio marcou um ano desde que a direita conservadora voltou ao poder na Coreia do Sul sob o comando do presidente Yoon Suk-yeol, do Partido do Poder Popular (PPP). Este período foi marcado por ferozes ataques do governo à classe trabalhadora, com uma correspondente ascensão da militância de classe. À medida que a crise capitalista se aprofunda, a luta de classes sul-coreana alcançará novos patamares.

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Opressão aos trabalhadores e sindicatos

No momento da eleição de Yoon, a Corrente Marxista Internacional (CMI) apresentou a seguinte perspectiva:

“Não há dúvida de que seu governo será um zeloso executor da vontade das Chaebols [grandes corporações]. Através dele, a classe dominante sul-coreana está se preparando para lançar um ataque feroz ao movimento operário e aos oprimidos.”

Essa perspectiva não apenas se tornou realidade, mas se acelerou nos últimos meses. Com uma falsa desculpa de “remediar a desigualdade de renda no mercado de trabalho”, o governo Yoon não perde tempo em tentar reverter as escassas reformas aprovadas pelo anterior governo democrata de Moon Jae-in, incluindo a Lei de Punição de Acidentes Graves e a jornada de trabalho de 52 horas semanais.

Em seu lugar, Yoon já havia procurado realizar contrarreformas que permitissem que a semana de trabalho fosse aumentada para 69 horas. Essa tentativa foi finalmente revertida após intensos protestos dos sindicatos e da juventude. Mas, de acordo com a Asian Labor Review, a atual semana de trabalho máxima de 52 horas permanece sob escrutínio, e o governo Yoon ainda planeja eventualmente introduzir um sistema de horário flexível que possa aumentar as horas de trabalho para 80 horas por semana. Antes de sua eleição, Yoon cogitou a ideia de instituir uma semana de trabalho de 120 horas!

A administração Yoon também está de olho nos próprios sindicatos. A esse respeito, nenhuma sutileza parlamentar foi necessária. Em 18 de janeiro, o Serviço Nacional de Inteligência da Coreia do Sul (NIS) invadiu a sede da Confederação de Sindicatos da Coreia (KCTU), considerada a central sindical mais militante do país. O ataque foi feito sob o pretexto de que um funcionário da central é suspeito de estar em contato com a Coreia do Norte, o que viola a Lei de Segurança Nacional da Coreia do Sul.

De acordo com Labor Notes, mil policiais e bombeiros cercaram o prédio do sindicato durante a operação. No final de maio, quatro funcionários da KCTU foram acusados pelo Tribunal Distrital de Suwon de serem membros de uma organização clandestina controlada pela Coreia do Norte, enquanto o NIS anunciava que a investigação contra a Confederação de Sindicatos da Coreia continuará e que eles “esperam encontrar mais membros dessa organização clandestina”.

A Lei de Segurança Nacional tem sido o cavalo de batalha favorito do Estado sul-coreano para reprimir a dissidência e era particularmente popular entre os ditadores militares do passado. A legislação ainda existe como uma arma de reserva do Estado para suprimir qualquer atividade considerada fora dos limites da “democracia” burguesa da Coreia do Sul. Em 2013, a lei foi usada pelo Tribunal Constitucional da Coreia do Sul para forçar a dissolução do Partido Progressista Unificado, um partido de esquerda que a certa altura serviu como ala política da KCTU.

Além das infundadas acusações de laços com a Coreia do Norte, muitos ativistas sindicais estão sob investigação policial por “recorrer a métodos de luta ilegais e violentos”. O Sindicato Coreano dos Trabalhadores da Construção (KCWU), afiliado à KCTU, sofreu 13 operações de busca e apreensão desde o final do ano passado, com 950 pessoas investigadas e 15 detidas. Essa campanha caluniosa, empreendida pelo Estado, pressionou um funcionário da KCWU da província de Gangwon, Yang Hoe-dong, que estava sendo acusado de “obstrução de negócios e extorsão”, a se incinerar em protesto.

O Estado também está golpeando as finanças dos sindicatos. Tanto a KCTU quanto a tradicionalmente conservadora Federação dos Sindicatos Coreanos (FKTU) foram declaradas inelegíveis a receber os subsídios estatais. Muitos sindicatos são ameaçados com multas por não cumprirem uma nova regra que exige que eles apresentem seus livros contábeis ao Estado.

Que Yoon e seu governo do Partido do Poder Popular iniciassem um ataque tão perverso contra a classe trabalhadora era esperado. Eles representam o bloco conservador que está profundamente ligado aos poderosos interesses das Chaebols. Por outro lado, o liberal Partido Democrático da Coreia permaneceu completamente em silêncio sobre esses ataques. Ambos os principais partidos políticos da Coreia do Sul, mais uma vez, revelam sua natureza de classe fundamentalmente idêntica. São partidos da burguesia que se opõem aos interesses da classe trabalhadora. No entanto, os trabalhadores não estão aceitando essa série de ataques de Yoon sem reagir.

Os trabalhadores contra-atacam

Em resposta aos ataques do Estado, a KCTU e muitos de seus sindicatos constituintes estão se preparando para uma greve geral em julho, para conduzir a luta contra o governo Yoon.

A KCTU mobilizou mais de 40 mil trabalhadores em Seul para uma manifestação no 1º de maio, durante a qual declararam que uma greve geral será organizada para derrubar Yoon.

A direção da KCTU prometeu que, além de seus próprios sindicatos, construirá uma “ampla aliança” para uma greve geral. Com cerca de 1,28 milhão de membros, a KCTU é a maior central sindical da Coreia do Sul. Mas, a FKTU, mais conservadora, possui 1,23 milhão de membros.

No entanto, a FKTU, tradicionalmente submissa, agora também está sob ataque do Estado. A pressão da crise capitalista está levando o regime de Yoon a minar uma de suas alavancas mais importantes na luta de classes na forma dos burocratas da FKTU, forçando-os (com relutância) a adotar uma linha mais militante. Juntamente à KCTU, as duas maiores federações sindicais do país agora exigem um aumento de 25% no salário-mínimo no próximo ano.

No 1º de maio, a FKTU também realizou a primeira convenção de trabalhadores em sete anos, durante a qual representantes de muitas indústrias, como bancários e trabalhadores da indústria de alimentos, falaram sobre as muitas lutas travadas contra o ataque dos patrões às condições.

A última vez que tal convenção foi realizada foi também quando a FKTU sofreu um ataque severo do governo conservador anterior de Park Geun-hye. A convocação desta reunião sinaliza que há uma fermentação significativa entre as fileiras dos sindicatos para responder aos ataques de Yoon.

Embora a taxa geral de sindicalização da Coreia do Sul permaneça baixa em 14,2%, ela vem aumentando constantemente nos últimos anos. Em 2021, o número total de sindicalizados era de 2,93 milhões de trabalhadores, um aumento de 128 mil em relação ao ano anterior. Isso faz parte de um processo geral que temos observado em todo o mundo, à medida que os trabalhadores começam a se voltar para as organizações de massa para se defenderem dos ataques às suas condições e padrões de vida.

Alguns setores novos e importantes da classe trabalhadora estão se organizando rapidamente. A taxa de adesão aos sindicatos de empresas de TI [Tecnologia da Informação] também está aumentando. O sindicato que representa os trabalhadores da Kakao, a empresa por trás de um dos superaplicativos mais populares da Coreia do Sul, que tinha 100 membros em 2018, agora tem 4 mil membros em todas as afiliadas da Kakao. A Naver, outra grande empresa de internet, viu seu sindicato crescer em cerca de 40% de seus membros na sede em janeiro de 2023 e agora tem 3,5 mil membros em todas as afiliadas. A Nexon tem 35% de seus funcionários sindicalizados. As subsidiárias do conglomerado, N-Tech Services (NAVER) e Kakao Mobility, já formaram seus próprios sindicatos majoritários.

A fermentação na base está claramente crescendo. Isso, juntamente ao ataque do Estado às organizações sindicais, está forçando até mesmo a direção sindical, geralmente servil, a se levantar e lutar.

Apresenta-se, portanto, uma grande oportunidade para uma frente única. A FKTU, embora totalmente burocratizada e submetida por sua atual liderança pelega, está sentindo a pressão de baixo. Por outro lado, embora a KCTU continue sendo a maior e mais militante central sindical, ela não pode lançar uma verdadeira greve geral quando seus membros representam pouco mais da metade dos trabalhadores organizados.

Para construir uma verdadeira greve geral, a KCTU deve lançar um apelo aos membros de base da FKTU, apesar de sua direção pelega, propondo uma greve genuinamente eficaz que possa paralisar a sociedade sul-coreana e atingir as Chaebols em seus alicerces.

Isso colocaria a FKTU firmemente na linha de tiro. Se rejeitarem tal proposta de ação conjunta, exporão sua natureza servil a seus membros. Ao fazê-lo, a KCTU poderia fortalecer sua própria autoridade e até acolher novos segmentos de trabalhadores em suas fileiras.

Capitalismo sul-coreano em crise

A intensificação da luta de classes está ocorrendo em um cenário de aprofundamento da crise do capitalismo sul-coreano.

A economia da Coreia do Sul desacelerou para um nível anêmico. Entre 2021 e 2022, a taxa de crescimento caiu de 4,1% para 2,6%. A OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico] espera que a economia da Coreia do Sul cresça 1,6% em 2023. Oh Suk-tae, economista da Societe Generale Securities, em Seul, tem uma previsão ainda mais pessimista de crescimento de só 0,8%. Ele disse sombriamente à Reuters: “Não vejo nenhum sinal de força nas cifras detalhadas sobre a trajetória futura da economia”.

Como grande parte do resto do mundo, a Coreia do Sul sofre com a inflação. Seu banco central foi compelido a seguir o exemplo do Federal Reserve dos EUA ao aumentar as taxas de juros. Embora a inflação tenha desacelerado um pouco, o chefe do banco central da Coreia do Sul afirma, por enquanto, que eles não têm planos de reverter o aumento das taxas de juros.

O declínio na demanda global também está devastando a economia sul-coreana dependente da exportação. Houve uma queda particularmente severa nas exportações durante fevereiro deste ano, quando todas as exportações sul-coreanas ficaram cerca de 15% abaixo dos níveis de um ano atrás. As vendas para a China foram cerca de 30% menores. Milton Ezrati, colaborador da Forbes, observou que “o declínio das exportações para os Estados Unidos, Europa e China aumenta a probabilidade de que esta importante economia asiática tenha entrado em recessão pela primeira vez desde a pandemia”.

Nesse contexto, há crises de longa data, de habitação, desigualdade e endividamento das famílias, que estão apenas piorando.

A situação na Coreia do Sul está longe de ser única. Na verdade, todos esses sintomas podem ser vistos em todo o mundo, levando ainda mais as massas a perceber, nas palavras de Lênin, “a impossibilidade de viver da maneira antiga e [a necessidade de] exigir mudanças”.

Todos os políticos capitalistas desacreditados

À medida que o conflito de classes aumenta na Coreia do Sul, a credibilidade de todos os políticos capitalistas está desmoronando.

Os ataques violentos de Yoon às massas renderam-lhe um índice de desaprovação que gira em torno de 60% nos últimos meses. A Yonhap News Agency conduziu uma pesquisa que mostra que, em todas as áreas políticas, o governo Yoon enfrenta mais de 50% de desaprovação.

Mas, por pior que as coisas estejam para o regime, o Partido Democrata da Coreia (DPK), que geralmente desempenha um papel análogo ao de sua contraparte americana como a “face sorridente do capitalismo”, está em um estado patético. Seu atual líder e ex-candidato presidencial, Lee Jae-myung, agora está sendo investigado por suborno. Embora o DPK agora lidere as pesquisas contra o PPP de Yoon Suk-yeol, ele não inspira nenhum entusiasmo. De acordo com uma pesquisa da KBS, mais de 50% dos entrevistados acreditam que a investigação contra Lee é crível e que ele deveria deixar o cargo de membro da Assembleia Nacional.

Os dois principais pilares da democracia burguesa da Coreia do Sul, o DPK e o PPP, estão completamente desacreditados. O que falta é um partido genuinamente independente da classe trabalhadora sul-coreana, um partido capaz de levar a classe trabalhadora à tomada do poder.

Perspectivas para um partido dos trabalhadores

No 1º de maio, o presidente da KCTU, Yang Kyung-soo, reiterou uma proposta submetida ao congresso extraordinário da KCTU em 24 de abril para a criação de um “partido de coalizão progressista centrado no trabalho”.

A partir de agora, parece que o plano da KCTU é encorajar quatro pequenos partidos de esquerda existentes (Justiça, Trabalho, Verde e Progressista) em um único “partido de coalizão”, que por sua vez seria apoiado pela KCTU. Dessa forma, eles esperam aumentar suas forças e acabar com a divisão entre a esquerda.

No entanto, enquanto os marxistas acolhem qualquer iniciativa para a criação de um partido genuíno dos trabalhadores coreanos como um veículo de luta, devemos levantar uma palavra de advertência.

A direção da KCTU parece pensar que a fragmentação da esquerda na frente política pode ser resolvida simplesmente ao se pedir a “unidade”. Devemos lembrar que a maioria dos partidos que a KCTU está convocando para se unificar separou-se da tentativa anterior da KCTU de construir um veículo político: o Partido Trabalhista Democrático (mais tarde Partido Progressista Unificado – UPP).

A UPP era um partido de coalizão de “tenda ampla”, baseado em um programa reformista frouxo, muito semelhante ao que a liderança da KCTU tem em mente para um novo partido. Essa fraqueza política está na raiz do fracasso do partido e do motivo pelo qual os partidos de esquerda fragmentários que dele surgiram são tão fracos. O principal problema não é de forma, mas de conteúdo.

O que é necessário é um programa ousado e inequívoco para transformar radicalmente a sociedade expropriando os capitalistas, administrando democraticamente a economia sob o controle dos trabalhadores e atendendo às necessidades mais prementes da classe trabalhadora coreana em torno de salários, horas de trabalho, moradia e assim por diante.

Além disso, a Coreia do Sul tem uma classe dominante perversa e um aparato estatal, que é apoiado pela presença direta do imperialismo norte-americano. A antiga UPP foi submetida à severa repressão estatal, que somada à sua fragilidade política, a obrigou a se desfazer. Se esse destino for evitado, a liderança de qualquer novo partido dos trabalhadores deve estar preparada para lutar até o fim contra o governo das Chaebols, e não ceder diante de ameaças ou repressão.

Não deve tentar apaziguar o podre Estado capitalista diluindo seu programa, mas responder aos ataques inevitáveis com desafio e métodos militantes de luta de classes. A fermentação na Coreia do Sul está chegando a um ponto em que as massas estariam dispostas a se juntar a essa luta.

Assim, ao invés de construir uma “coalizão” sobre uma base ambígua e sem princípios (uma proposta que parece já ter sido rejeitada por três dos quatro partidos que a KCTU está tentando conquistar), um novo partido operário deve ser fundado sobre um claro e militante programa socialista. Este é o verdadeiro caminho para forjar um partido de luta forte e unificado que possa atrair as mais amplas camadas de trabalhadores e jovens, tornando-se uma arma poderosa em suas mãos para as batalhas que virão.

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